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Ricardo Costa e o talento no andebol: “Os meus filhos foram um bocado cobaias. Seu eu tivesse um terceiro filho…”

Ricardo Costa, treinador do Sporting. Foto: Daniel Leal/SM

Presente no Pavilhão Multiusos de Gondomar para participar como um dos preletores do 19.º Congresso Técnico Científico de Andebol, o treinador da equipa sénior masculina do Sporting, Ricardo Costa, conversou este sábado com o moderador Luís Santos (selecionador da Seleção Nacional feminina sub-18) sobre o tema “Treinar o talento”. Diante de um espaço repleto de profissionais do desporto, o antigo internacional trouxe uma série de argumentos e ponderações sobre o desenvolvimento da formação de atletas. E não se furtou a oferecer exemplos pessoais.

Como é público, Ricardo Costa é pai dos internacionais sub-20 Francisco (17 anos) e Martim Costa (19). Para o treinador do Sporting, um fundamento essencial para o desenvolvimento do atleta e a formação de um jogador de alto de rendimento está ligado à parte mental. Acerca do tema, o profissional EHF Master Coach exemplificou com um episódio que aconteceu há alguns anos com o Martim.

“Os meus filhos foram um bocado cobaias minhas. Não sei se eu tivesse um terceiro filho… Não sei se ele podia ou não ser jogador, mas creio que podia também. Vou contar uma situação de quando eu ainda era treinador do FC Porto e fui dar treino aos iniciados do Colégio dos Carvalhos, no qual na equipa de iniciados estava o Martim. Eu acabei o treino dececionado com a atitude do Martim. Ele treinou a 10%, estava ali a rir, relaxado. Viemos para casa, não é comum e não há muitas situações de misturarmos o lado jogador com o pessoal. Mas neste dia fui ter à cama com ele. Levei um livro dos 75 anos de andebol à cama. Eu disse-lhe: ‘não tenho aspiração nenhuma que tu te tornes jogador de andebol, mas a atitude que tiveste no treino hoje envergonha-me’. Acho que foi o momento que deu um clique na vida dele”, contou Ricardo.

“Eu ainda lhe disse mais: ‘se tu não treinares todos os dias, e mais, sendo de longe o melhor atleta da tua equipa, não vais conseguir chegar lá. Daqui só vão chegar um ou dois. Essa abordagem mental é fundamental mesmo a um miúdo de 12 anos. Acho que essa abordagem mental, se calhar um pai que não é do desporto não consegue ter, não vai ter a mesma atitude. E penso que essa intenção é fundamental”, acrescentou.

De acordo com Ricardo Costa, os clubes deveriam reservar um maior tempo e investimento à formação mental dos jogadores: “Alguns atletas não têm problema de dizer ‘estou mal, eu preciso de um psicólogo’. Outros negam-se. Na sociedade é assim: se dizemos que vamos ao psiquiatra, dizem que estamos loucos, e não é assim. Quando eu parei de jogar aos 36 anos, procurei um psiquiatra. Eu não estava maluco, mas precisava de ajuda, um novo horizonte estava a abrir-se na minha vida, com novos objetivos, tanto profissionais como em outras situações. Por isso, é fundamental a parte mental. Se não estivermos devidamente abertos e as equipas não estiverem estruturadas para isso, dificilmente teremos sucesso”, afirmou.

Martim Costa é um dos filhos de Ricardo Costa. Foto: FAP

Outra ponto fundamental para a formação dos atletas, na visão do treinador do Sporting, está no conhecimento teórico. Presente a observar o Europeu Sub-20, que decorre até o próximo dia 17 em solo português, Ricardo Costa trouxe uma observação acerca dos atletas espanhóis.

“O conhecimento teórico é fundamental. Ontem, estava a ver o jogo da Espanha e acho fantástico a interação entre os jogadores, a forma de eles falarem, de usarem determinador termos. Conhecem o jogo como ninguém. Eles teoricamente dominam as palavras que usam, é notório. Se calhar, não estimulamos o conhecimento dos nossos atletas. Os espanhóis são muito ‘futeboleiros’ a discutir o andebol porque conhecem o jogo. E também conseguem ter um aspeto crítico”, observou, antes de trazer mais um exemplo que vem de dentro de casa.

“O Martim não tanto, mas o Kiko [Francisco] desde os 3, 4 anos, é mesmo verdade, ele fazia considerações sobre a minha forma de jogar que a mim me irritavam. Um puto de 4 anos a mandar-me ‘bitaites’, irritava-me. Mas acho que isso é fundamental – ter uma atitude crítica do que está a se fazer. E o conhecimento teórico é fundamental, não há outro caminho”, destacou.

Sobre a definição do talento, tema da preleção, Ricardo Costa afirmou tratar-se de um tema abstrato e de difícil definição. Para ele, inclusive, nem todos os atletas de alto rendimento possuem um talento natural, no entanto, são capazes de desenvolver outras virtudes capazes de fazê-los profissionais de sucesso.

“Tive um treinador por cinco anos, o Jordi Ribera [na altura, treinador de Ricardo Costa no Ademar León], que costumava dizer que não era pago para treinar muito, mas era pago para ganhar. Dedicava-se 18 horas por dia, ele não tinha família nem nada, e dizia que ao final somos pagos para ganhar. Se não ganhar, as coisas não funcionam. Mas sobre o talento, o treino tem que ter outro tipo de abordagem. Falar de talento é muito abstrato, é muito difícil definir o que é talento. Se olharmos para o sénior, todos têm talento? Diria que não. Alguns atletas, olhamos para eles, e não reconhecemos talentos. Mas eles têm que uma capacidade enorme de treinar. E ter uma capacidade de treino é talento. É talento porque pegamos em muitos atletas que correm muito, saltam muito, mas não significa dizer que podem chegar ao mais alto nível sem o treino”, explicou.

O 19.º Congresso Técnico Científico de Andebol é organizado pela Federação de Andebol de Portugal, com o apoio da Câmara Municipal de Gondomar. O Congresso Técnico Científico de Andebol está homologado pela EHF, para a renovação da EHF Pro License e pelo IPDJ, para efeitos da formação contínua de treinadores com 3 UC.

Francisco Costa está a disputar o Europeu Sub-20. Foto: FAP

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