A presidente da Coaching Association Canada (CAC), congénere da Confederação dos Treinadores de Portugal, Lorraine Lafrenière falou à SportMagazine sobre as barreiras ainda por ultrapassar para as meninas e mulheres no desporto, e na urgente necessidade de promover uma autoconfiança que se estenda às suas vidas e carreiras profissionais. Quanto ao modelo relacional no desporto, a nomeada duas vezes como uma das vinte mulheres mais influentes do desporto no Canadá defende a centralidade do atleta e a liderança do treinador.
Abaixo, pode-se ler uma parte da entrevista publicada originalmente na edição número 1 da nossa revista. A entrevista completa com Lafrenière está disponível para assinantes. Se ainda não é, saiba como fazer para integrar o nosso grupo de leitores e colaborar com o nosso projeto.
SportMagazine (SM) – Esteve no Congresso Mundial da ICCE em Lisboa. Que impressões levou do evento?
Lorraine Lafrenière (LL) – Sim, estive no Congresso de Lisboa e foi fantástico. Estou tão impressionada com a Carolina [Mendonça, da comunicação dos Treinadores de Portugal] e o Pedro [Sequeira, presidente da Confederação de Treinadores de Portugal]. A sua liderança fez com que esta conferência fosse incrivelmente bem-sucedida. Estou a ser muito sincera com esta declaração, pois já estive presente em muitas conferências. Eles fizeram um trabalho fantástico em circunstâncias muito difíceis. Foram uma inspiração para assistir e permanecer confiante, mesmo perante os desafios da Covid-19.
SM – De que forma o desporto tem contribuído, ou não, para a integração plena das mulheres na sociedade?
LL – O desporto é uma ferramenta poderosa no desenvolvimento holístico de todos os indivíduos em qualquer idade. A capacidade de deixar de lado o género no desempenho e na liderança é poderosa. Dar às nossas meninas a oportunidade de provar as suas capacidades no campo de jogo estende-se à sua autoconfiança na escola, nas suas carreiras e na vida em geral. O desporto também oferece a oportunidade de criar papéis-modelo femininos para meninas e meninos. Além disso, os estudos indicam muito claramente que, para as jovens, reconhecer este modelo feminino é fundamental para as suas escolhas de vida. A afirmação “não podes ser o que não podes ver” é muito verdadeira. As jovens precisam de ver mulheres confiantes em papéis de liderança e o desporto cria essa oportunidade.
SM – O planeamento a longo prazo da vida de um atleta, na sua opinião, é diferente porque cada disciplina atlética e cada morfologia requer essa diferença, ou também é diferente porque, de alguma forma, reproduz estereótipos sexistas?
LL – A construção de um modelo de desenvolvimento de longo prazo para atletas é fundamental para remover barreiras identificadas e também para estabelecer a idade/nível de desenvolvimento certas para ambos os sexos. É fundamental que o desporto seja planeado para cada idade e nível de desenvolvimento, de forma a aumentar a retenção dos praticantes.
SM – O abandono é mais frequente em atletas masculinos ou femininos? Podem identificar-se as principais causas?
LL – Sim, os estudos concluem de modo convincente que as jovens abandonam o desporto a partir dos 13/12 anos de idade. Há muitas razões para isso, mas uma das mais relevantes é que elas precisam de papéis-modelo femininos no desporto – e na sua experiência desportiva – para se manterem envolvidas. Este é um momento específico no desenvolvimento físico e emocional de jovens meninas e se o ambiente é dominado por homens, isso leva a um maior abandono. No geral, crianças afastam-se do desporto quando este deixa de ser divertido. Este é o fator principal para a permanência. Some-se a isso quando as meninas jovens não se sentem no seu ambiente e podemos entender por que razão um terço acaba por abandonar a prática desportiva até final da adolescência.
SM – E qual é o papel dos pais/família na gestão da carreira de um atleta?
LL – Isso é um desafio! Um treinador é um treinador, um pai é um pai. Assim como um professor é um professor e não um pai. Os dois papéis não devem realmente ser confundidos.
SM – Qual deve ser a matriz para a relação entre o treinador e os pais do atleta?
LL – A questão coloca-se de forma diferente quando se trata de menores. Garantir um ambiente desportivo seguro é um papel importante para os pais, um papel que vai diminuindo de importância à medida que os filhos vão atingindo a idade adulta. Os pais devem envolver-se, garantir a segurança e monitorizar o bem-estar dos seus filhos. Um pai deve ter a oportunidade de modelar o seu envolvimento com o treinador, mas sempre respeitando o papel deste último.