Rui Tiago Santos, treinador de polo aquático português, encontra-se em Espanha a treinar o Club Natación Rubi, conseguindo levar o mesmo ao patamar mais alto do polo aquático espanhol. O técnico luso conversou com a SportMagazine sobre o início da sua carreira até ao momento atual e das diferentes perspetivas entre o polo aquático português e o espanhol.
SportMagazine (SM) – Como se deu todo o seu início de carreira no polo aquático e porquê a escolha desta modalidade?
Rui Santos (RS) – Iniciei a minha carreira de treinador quando ainda era bastante jovem, no Clube Fluvial Portuense. Treinava nessa altura uma equipa de formação feminina e era jogador ao mesmo tempo. Mais tarde deram-me a oportunidade de treinar a equipa sénior, com a qual estive bastante tempo até que me convidaram a treinar uma equipa em Sevilha da Division de Honor Espanhola. Acabo no Polo Aquático porque o meu percurso na Natação tinha terminado e procurava outro desporto. O meu irmão jogava Polo, tinha amigos que jogavam e desde o primeiro dia que me apaixonei por esta modalidade e aqui sigo.
Aos 17 anos os responsáveis pela secção de Polo detetaram em mim qualidades para liderar um grupo de meninas e assim começou tudo. Não esqueço o primeiro jogo que tive como treinador, em Paços de Ferreira. Perdemos por muitos e senti que o mundo ia acabar. Mas o mundo não acabou e continuei a ser jogador e treinador dessas meninas que se foram agigantando. Com elas e algumas jogadoras mais velhas e outras que entretanto se juntaram ao grupo conseguimos construir um projeto desportivo muito bonito com participações na Champions League, títulos nacionais absolutos e de camadas jovens… até que uma equipa espanhola de Sevilha reparou em mim e me deu a oportunidade de treinar em Espanha. Daí até chegar ao Rubí foi tudo muito rápido.
Hoje em dia sou treinador de rapazes, de uma equipa que joga uma das ligas mais fortes do mundo. Vivo numa cidade que é uma das mais importantes no panorama do nosso desporto como é Barcelona.
SM – De momento encontra-se a treinar em espanhola tendo, inclusive, garantido a subida de divisão do Rubí na época passada. Que diferenças encontra entre o pólo aquático português e o polo aquático espanhol?
RS – No final da época 17/18 o Club Natación Rubi mostrou interesse em mim e desde essa época que faço parte da equipa técnica. Em 20/21 o nosso diretor técnico deu-me uma “prenda” que foi treinar a equipa sénior masculina. Nessa época estivemos invictos toda a fase regular da primeira divisão e no play off conseguimos ser campeões. Depois tivemos de disputar outro play off para subir à liga principal (División de Honor). Conseguimos ganhar e assim subir à máxima categoria de Espanha e consequentemente jogar numa das melhores ligas do Mundo. O ano passado fizemos uma temporada muito bonita sendo das equipas que, acabada de subir, mais pontos fez na história da DH.
As comparações são sempre injustas e, neste caso, não fazem sentido. Espanha é top do Mundo em masculinos e da Europa em femininos. Em Portugal, onde o desporto começa e acaba no Porto vs Benfica (futebol), o Polo Aquático é muito pouco expressivo. Penso que Polo em Portugal deve olhar para Espanha como referência e procurar entender as boas práticas, aproveitar os recursos que tem de forma mais profissional e conseguir ”prender” os mais novos a este desporto.
SM – O pólo aquático tem muita visibilidade em Espanha? Se sim, o que acha que Portugal tem que fazer para chegar a um patamar mais elevado na modalidade?
RS – A nível de visibilidade, em Espanha o Polo Aquático não é dos mais relevantes. Contudo, e na área de Barcelona, é verdade que tem bastante impacto na sociedade. São ou já foram campeões mundiais em ambos os géneros , têm equipas que disputam todos os anos as competições europeias e isso tem impacto socialmente. Para mim Portugal tem de ser capaz de fazer mais com os recursos que tem. Temos de conseguir que haja continuidade nos trabalhos das seleções seniores e, mais importante para mim, que haja um plano para a formação, um plano que preveja a criação de novos clubes, captação de jovens talentos, cuidar dos jogadores jovens, dos árbitros, dos treinadores que existem e promover ações que criem ambição e motivem quem pratica a modalidade.
SM – Nota algumas fragilidades do pólo aquático português comparativamente com o espanhol? Ou vice-versa?
RS – Como disse antes, não importa comparar. Portugal tem de potenciar o que faz bem e olhar para Espanha ou outro país mais desenvolvido e compreender as boas práticas. Em Portugal também há muitas coisas boas. Por exemplo tem um projeto super interessante que é o Portugal a Nadar que fomenta uma aprendizagem multidisciplinar no âmbito da natação e que pode ser a base para conseguir novos praticantes que desde muito pequenos tenham contacto com o polo aquático.
Por outro lado vivemos uma mentalidade desportiva do “futebol”, do “Porto vs Benfica” onde o que importa é ganhar. O polo aquático de Portugal e creio que o desporto em geral necessita de deixar de fazer as coisas pelos resultados e preocupar-se com o processo. Com o como? O quando? Onde? Vivemos numa sociedade que exige resultados imediatos e o polo em particular necessita de um plano de desenvolvimento desportivo a longo prazo, no cais da piscina e não uma série de pdf’s bonitos.
Em Espanha estão noutro patamar. No da excelência e do rendimento. Tudo é mais profissional. Há muita e boa concorrência e isso obriga a quem queira estar nesse barco a dar o seu melhor.
SM – Quais são, enquanto treinador, os seus objetivos futuros? Conta com um regresso a Portugal?
RS – Quando estás fora vês as coisas de outra forma. Voltar ao Porto é muito aliciante, pelos meus pais, pelos amigos porque aqui se respira melhor, se vive melhor e educar a minha filha neste ambiente seria muito bonito. Mas hoje em dia tenho o privilégio de poder fazer parte de um clube onde me sinto bem a treinar uns “chavales” que são uma parte muito importante da minha vida. Quero continuar a crescer, a aprender, desfrutando da liga e de Barcelona (uma das capitais europeias do Polo Aquático). Poder dedicar-me desta forma ao Polo foi um sonho que tive. Com muitos sacrifícios e com a ajuda de muitas pessoas foi possível chegar aqui e agora é tempo de viver o sonho sem olhar para trás.