Marcos Freitas, atleta português de ténis de mesa, viu a sua vida mudar de repente, devido aos conflitos entre a Rússia e a Ucrânia deste ano. O atleta fazia parte do Fakel Gazprom, clube onde estava há quatro épocas. A guerra obrigou o português a mudar de clube, assinando pelo Pontoise Cergy, clube francês que já havia representado durante sete épocas e no qual conquistou duas Ligas dos Campeões (2011/12 e 2018/19).
O português assinou um contrato de duas épocas com o clube francês. No entanto, apesar de se sentir aliviado, não esconde a tristeza de ter abandonado o clube russo.
“Eu joguei neste clube russo quatro épocas. Sempre fui bem tratado, tínhamos boa equipa, sempre lutámos pelo título europeu da Liga dos Campeões. É um clube que é muito bom, um dos melhores da Europa. Eu tinha a esperança de poder continuar, o clube também tinha interesse que continuasse, mas quando isto tudo aconteceu mudou tudo (…) É um clube que compreende a minha decisão. A decisão não foi só minha, os meus colegas acabaram também por abandonar o clube na próxima época (…) Isto afeta tudo e o desporto também é afetado”, confessou em entrevista à SportMagazine.
Marcos Freitas afirma ainda que a incerteza de jogar nas competições europeias teve um enorme peso na sua decisão, porque assim o clube “passa só a ter objetivos a nível de liga russa e isso não é interessante para nós, atletas”, afirmou. Contudo, apesar da facilidade com que aceitou o convite do Pontoise Cergy, reforça várias vezes que sempre foi bem tratado pelo clube russo.
Para além das repercussões que o conflito entre a Ucrânia e a Rússia teve na sua carreira, Marcos Freitas fala da situação do ténis de mesa em Portugal e dos seus objetivos futuros.
SportMagazine (SM) – Mais dentro daquilo que é a modalidade de ténis de mesa, sente que Portugal cada vez está mais por dentro do desporto em si ou ainda sente pouca visibilidade por parte dos portugueses?
Marcos Freitas (MF) – Sim, sinceramente sinto que o ténis de mesa não tem evoluído muito nos anos. Sinto que realmente alguns jogadores têm visibilidade, o que é normal, devido aos resultados internacionais que têm sido bons ao longo dos anos. Mas a nível de modalidade, não vejo um acréscimo de jogadores/praticantes. Não sinto que a modalidade esteja a crescer como eu queria. Mas pronto, também é difícil saber porquê. Em Portugal, são poucas as modalidades que têm crescido, não é só o ténis de mesa. E acho que é um problema cultural, maior parte das pessoas só quer acompanhar o futebol, não é nada de novo e não sei como se pode mudar isto no futuro, mas isto é a minha opinião. O ténis de mesa não tem crescido muito ao longo destes anos. Sim, temos tido bons resultados, mas a nível de praticantes, de número de praticantes, de adeptos, de publico, não tem evoluído muito bem.
SM – A nível de treino, como é que um jogador se prepara para grandes competições, como os Jogos Olímpicos, por exemplo? O que é que é necessário?
MF – A preparação para os Jogos Olímpicos é muito idêntica a uma preparação para outras provas importantes, como Europeus, Jogos Mundiais, Taça do Mundo. Depende sempre da quantidade de dias que temos e basicamente trata-se por planear muito bem a parte física. Talvez nas primeiras semanas pensar mais a nível físico, passar mais tempo no ginásio, menos tempo na mesa e depois com o passar do tempo e o aproximar da prova é o contrário. Passar mais tempo na mesa e menos no ginásio. Mas basicamente é uma preparação igual às outras. Não é por serem os Jogos Olímpicos que se faz algo diferente ou especial. Nos Jogos Olímpicos o que se quer é estar na nossa melhor forma e é o que se quer nas outras provas. A diferença é que para os Jogos Olímpicos temos mais tempo para treinar, porque há realmente uma pausa nas outras competições, ou seja, temos mais dias para preparar, mas a preparação é sempre feita na mesma maneira, como se fosse para outra prova de grande importância.
SM – Ricardo Oliveira, selecionador nacional, afirma que enquanto atleta é-se muito introspetivo, digamos que “se olha muito para o nosso umbigo e não para o que está à volta”. O Marcos sente isso?
MF – Os jogadores de ténis de mesa, tendo em conta que somos uma modalidade individual, somos sempre muito individualistas, tentamos sempre olhar para nós próprios. A maior parte das vezes não culpamos os treinadores pelos nossos erros, por exemplo. Olhamos sempre para nós porque realmente estamos nós na mesa, estamos sozinhos. É um jogo em que temos de decidir muito rápido, os pontos são muito curtos. Os intervalos também são muito curtos. Só podemos fazer uma pausa para ir à toalha de seis em seis pontos. É preciso saber sobreviver e tomar decisões muito rápido e é por isso que com o passar do tempo aprendemos a ser mais individualistas e olhamos para nós próprios, para os nossos defeitos e virtudes.
SM – Mais uma vez Ricardo Oliveira põe o seu nome, juntamente com outros, na atual elite do ténis de mesa nacional. O que sente quando ouve isto? E, já agora, sente que Portugal tem cada vez mais poderio e mais argumentos para ser um país reconhecido pela modalidade?
MF – Claro que é bom ouvir que faço parte da elite nacional. Sinto que não é novidade e já faço parte da seleção há muitos anos, sempre com resultados muito positivos ano após ano. Sempre com um ranking mundial muito elevado também, e penso que sou conhecido, e a nossa modalidade é também conhecida, pelo publico no geral. Temos tido bons resultados, já participei em quatro Jogos Olímpicos, onde tenho dois quintos lugares, tive ali perto de
lutar por uma medalha. Penso que no geral tenho conhecimento dos portugueses, da população, o que é bom e espero continuar a trabalhar bem e ambicioso para continuar neste caminho, porque ainda tenho muitas coisas para ganhar, objetivos para alcançar e espero continuar motivado para continuar a treinar no dia a dia.
SM – Quais os seus objetivos a curto e a longo prazo enquanto atleta de ténis de mesa?
MF – A curto prazo é voltar a subir no ranking. Neste momento tenho o ranking alto, estou em 31º., mas já estive muito melhor, já estive número sete, cerca de 10 anos no top20. Desci agora umas posições, devido a algumas lesões que tive que fez com que não pudesse participar em algumas provas. Mas o objetivo a curto prazo é voltar na minha máxima força e voltar a subir no ranking mundial. E a longo prazo é lutar por medalhas nas provas principais – Europeus, Mundiais e Jogos Olímpicos. Esse é sempre o meu objetivo, tem sido o meu objetivo nos últimos anos e é para isso que trabalho todos os dias, para conseguir esses objetivos, essas medalhas, porque são realmente resultados que ficam para sempre.