A Seleção Nacional de squash feminino garantiu a subida à segunda divisão do Europeu durante o mês passado, após vencer a Eslovénia nas meias-finais, por 2-1, apurando-se também para a final do Campeonato Europeu de Equipas Femininas 2022. Nessa mesma final, a equipa acabou por sair derrotada diante da Dinamarca.
Luís Carvalho, atual diretor técnico nacional da Federação Nacional de Squash (FNS), conversou com a SportMagazine precisamente sobre esta conquista. A preparação para a competição, a visibilidade da modalidade em Portugal e os objetivos que já alcançou e os que ainda deseja alcançar também foram temas abordados.
SportMagazine (SM) – Recentemente, a Seleção Nacional de squash feminino garantiu a subida à segunda divisão europeia. O que significa isto para si enquanto treinador?
Luís Carvalho (LC) – Para mim é a concretização de um trabalho de criação de espírito de grupo que depois se concretizou no resultado. Nós conseguimos construir uma equipa, não só das atletas que foram, como também das atletas que ficaram cá, mas que ajudaram na preparação de todas as outras aumentando o nível total. Depois é a preparação. Eu na meia-final, que é o que garante a subida de divisão, pensava e dizia às atletas: “vocês merecem pelo trabalho que fizeram, merecem ser felizes”.
SM – Que metodologia de treino utiliza com as suas atletas e como é que preparou os jogos que permitiram a subida de divisão?
LC – Enquanto diretor técnico nacional, eu não sou treinador de nenhuma das atletas. O que nós criámos no âmbito da Federação Nacional de Squash foi uma equipa que permitisse acompanhar as atletas e a criação de um lote alargado de atletas para trabalhar, reuniões não só com a equipa feminina, mas com a masculina, que também estava a preparar-se para o europeu e também obteve uma classificação histórica, o sétimo lugar. E essa equipa multidisciplinar permitiu que elas também sentissem esse acompanhamento. Nós não tínhamos um plano de treinos específico para cada uma. Permitíamos-lhes, se elas assim o entendessem, esse plano. Tínhamos sim um plano físico que elas deviam cumprir. Porque o que acontece muito no squash atual é uma enorme carga física e muitas vezes, atletas nacionais não estão habituadas a isso. Portanto esse era o planeamento e a preparação que tínhamos: reuniões todas as semanas, acompanhamento permanente da atividade delas, ligação ao treinador quando os têm. Muitas vezes não têm treinador e treinam individualmente. Então essa era a nossa metodologia. Fizemos dois estágios com todas as atletas para aferir o valor de cada uma, mas também para sentirem o quanto tinham de trabalhar a mais e sentir quem estaria melhor ou pior preparada. Portanto essa foi a nossa metodologia.
SM – O que é que um desporto como squash exige a mais nas atletas que outros desportos não exijam tanto, a nível físico ou até psicológico?
LC – A palavra que define o squash é uma palavra que está muito na moda atualmente, que é a resiliência. É um jogo disputado até 11, temos de ganhar por vantagem de dois pontos. As pessoas têm de ter, na parte mental, o desejo de continuar a jogar. Não é por perder um ponto que há desgraça. E foi esse o trabalho feito com as atletas. Não deixar cair no sentimento de euforia, mas também no sentimento da desgraça quando perdiam um ponto. Novo ponto viria para ser disputado e era isso que tinham de ter na cabeça. O que acontece muito no squash é o refresh constante do ponto, há uma jogada que parece que vai terminar, mas a jogada vai evoluindo e não acaba. O jogador tem de estar preparado mentalmente para trabalhar o ponto. O squash é um desporto praticado por dois atletas no mesmo espaço físico. Aqui estão a lutar pelo espaço e controlar a posição central. Não podemos estar a atacar e ao mesmo tempo a defender. O que leva as pessoas a querer vir experimentar o squash é este espírito de resiliência. Não é um desporto fácil, não é para pessoas fáceis, é para pessoas que percebem que a vida é de lutadores e de pessoas que querem trabalhar mas que serão felizes no final.
SM – Em Portugal, ainda existem muitas modalidades que acabam por não ser tão faladas. O squash é uma delas. Porque é que acha que isso acaba por acontecer?
LC – O squash já foi um desporto de moda nos anos 80 e em termos de desporto há modas. Tivemos a moda dos desportos radicais, tudo vai por modas. O squash tem especificidades e se calhar é isso que as pessoas não querem. No entanto tem vindo a subir o número de praticantes. Se calhar as pessoas perceberam que a vida fácil, os desportos fáceis, se calhar não será tanto o conceito de desporto. O desporto social tem a sua função, o squash também o consegue ser, mas temos de nos entregar, o desporto pressupõe suar, esforço físico. Se não temos isso, é desporto também, mas é nisto que o squash é diferente. Durante meia hora tenho atividade física intensa e após essa meia hora é recuperação total. O que eu tive foi um pico de adrenalina e um gasto de calorias fabuloso em meia hora. Tanto exige reação rápida como a capacidade desta reação ao longo do tempo. Existe o conceito também de que o squash é violento. O squash é zero violento, não há contacto. Podem existir e existem regras, mas não pressupões o contacto físico entre os atletas. Tudo o que for mal jogado é violento. O futebol se for mal jogado é violento, se andarmos todos às canelas uns dos outros. Mas ninguém diz que é violento. Posso dar com a raquete na cabeça do meu adversário? Posso, a probabilidade de isso acontecer pode existir, mas não é normal, ninguém está ali para causar dano físico ao seu adversário como em nenhuma atividade física. O desporto não pressupõe violência. Portanto a ideia de violência no squash é completamente ultrapassada e sem sentido. O squash é um desporto atrativo, nomeadamente no feminino. Consegue um gasto calórico muito interessante em pouco tempo.
SM – Acha que com o recente sucesso da seleção feminina e outros que, certamente, estarão para vir, o squash pode voltar a estar na moda, conforme disse?
LC – Eu acho que sim. Acho que o squash, desde que a Federação Nacional de Squash teve o seu reconhecimento pelo IPDJ, que foi um período histórico que tinha perdido o estatuto de utilidade publica desportiva, fez um trabalho de reconhecimento de estatuto de utilidade pública desportiva e os resultados que aparecem agora a nível de federação e em termos desportivos são também fruto do IPDJ, temos que o realçar. Um apoio que nos permite levar uma maior profissionalização. Por exemplo, eu agora sou o diretor técnico oficial da FNS. O que nos permitiu criar equipas, trabalhar de maneira distinta. E não há squash sem dinheiro. Não conseguimos trazer atletas, deslocar-nos aos campeonatos, sem dinheiro. Acredito que este trabalho da federação vai permitir um novo crescimento do squash.
SM – Acha que esta conquista do squash feminino terá, de alguma forma, repercussão naquilo que é a visibilidade da modalidade?
LC – Uma das coisas importantes nesta conquista foi todo o trabalho de marketing e comunicação que houve. Foi uma aposta que a federação fez e que tenho de concluir que funcionou. Estou neste momento a ser entrevistado por si, por isso resultou. O squash feminino tem sido trabalhado e penso que sim, dá essa visibilidade. Dá aquela visibilidade de que o nosso vizinho, que nem liga a desporto nem sabe o que fazemos, se cruza connosco na rua e nos diz “parabéns”. Isto é uma visibilidade que os resultados trazem, e esse trabalho de marketing também nos permite esse resultado e o aumento de praticantes. É necessário voltar a colocar a palavra “squash” nos desportos nacionais. É um desporto que tem o seu lugar. É para pessoas especificas? É. Como todos os outros. Há quem goste de pugilismo. Uns fazem surf, outros jogam ténis… há lugar para todos os desportos. O squash feminino tem vindo a crescer bastante na federação. São 30% dos filiados.
SM – Enquanto diretor técnico, quais são os seus objetivos a curto e a longo prazo a comando da Seleção Nacional?
LC – A curto prazo devo dizer que os objetivos que foram estabelecidos em janeiro, eram as três participações das seleções nacionais – feminina, masculina e sub-17 – em três campeonatos da Europa, foram ultrapassados. Temos a subida de divisão do feminino. Temos a manutenção da equipa masculina que acabou por ficar em 7º lugar, o que nos tirou do sufoco da descida. Nos sub-17 tivemos uma das melhores classificações de sempre, um 8º lugar.
A médio e longo prazo são, obviamente, aumentar a base de praticantes, meter os clubes a trabalhar com a FNS nisso mesmo, indo às escolas. E também a criação de um plano de alto rendimento para os nossos melhores atletas. O Rui Soares, por exemplo, é o nosso melhor atleta, está em 61 do mundo. Há outros atletas a tentar a profissionalização. Isto também é uma consequência de um trabalho feito nas seleções. Os jogadores perceberam que valia a pena tentar a profissionalização. Não só porque a federação consegue potencialmente apoiar, mas porque perceberam a sua mais valia desportiva em termos europeus. São estes os objetivos a médio longo prazo: o aumento dos filiados, dos praticantes de squash. Aliás, quero é que pratiquem a modalidade, o resto acontece por tabela. E ainda uma criação de um plano de alto rendimento desportivo para os nossos atletas.