O Comité Olímpico de Portugal (COP) apresentou, num contexto marcado pelas próximas eleições legislativas portuguesas, que se realizam a 10 de março de 2024, contributos para os programas eleitorais dos partidos políticos concorrentes, seguindo uma prática regular nestas ocasiões de reflexão e redação de propostas eleitorais.
Conforme se pode conferir no portal do COP, este entende ser seu dever coligir, apresentar e promover a discussão sobre um conjunto de medidas específicas e políticas públicas essenciais ao desenvolvimento do desporto nacional. Passamos, assim, a expôr as propostas do COP a partir do texto onde este expõe estes contributos:
“O desporto em Portugal, considerando a forma como tem sido enquadrado pelos sucessivos governos e tendo por referência um conjunto de debilidades sistémicas expressas em diversos indicadores que posicionam o País na cauda do desenvolvimento desportivo europeu, carece, há longa data, de um processo de reforma em diversas dimensões críticas que o COP tem vindo a apontar, pelo que o documento em apreço congrega, de forma sintética e objetiva, opções estratégicas nesse propósito, suportado em vários estudos e pareceres elaborados ao longo do tempo, disponíveis para consulta através de ligações neste documento.
Assim, numa primeira instância, o COP considera prioritária neste âmbito a abordagem das seguintes três temáticas: (1) A reforma do estatuto do dirigente desportivo em regime de voluntariado, (2) o modelo de financiamento do desporto nacional e (3) a orgânica do Instituto Português do Desporto e Juventude, I.P em vigor.
(1) Quanto a esta temática, cumpre referir que o Decreto-Lei n.º 267/95, de 18 de outubro, não serve minimamente os interesses do desporto nacional e daqueles que são o seu verdadeiro motor, os dirigentes desportivos voluntários. Trata-se de um diploma com quase 30 anos que necessita urgentemente de ser revisto, tendo em conta a importância de se fomentar a renovação geracional no dirigismo desportivo voluntário, designadamente, mas não exclusivamente, através da promoção de incentivos de índole fiscal e da majoração do tempo de serviço dedicado ao voluntariado, devendo igualmente estimular-se a formação destes agentes.
Sobre esta matéria o COP elaborou e partilhou um documento de reflexão que pode ser consultado através da ligação disponível aqui.
(2) Em relação à segunda temática, o COP tem vindo a sustentar:
· o aumento do nível de financiamento canalizado para o setor, nomeadamente do financiamento público, que é substancialmente inferior à média europeia,
· mitigando a excessiva dependência do desporto da volatilidade das receitas dos Jogos Sociais e Apostas Desportivas, reforçando-se a sustentabilidade do modelo de financiamento do desporto nacional, e que os programas de Preparação Olímpica e Paralímpica deixem de ter esta origem;
· o estabelecimento de uma maior ligação entre o financiamento público e o sucesso desportivo, reduzindo-se as burocracias associadas;
· a possibilidade de se concentrar as várias áreas de financiamento público do IPDJ num único contrato programa de desenvolvimento desportivo anual por federação desportiva.
* (o COP já elaborou pareceres sobre as duas primeiras questões, que podem ser consultados através das ligações disponíveis aqui e aqui)
(3) No que respeita a esta temática, como é sabido, há pouco mais de uma década, o XIX Governo Constitucional determinou a fusão do Instituto do Desporto de Portugal e do Instituto Português da Juventude, com claros prejuízos para os dois setores em causa, nomeadamente ao nível dos recursos disponíveis, do estabelecimento de prioridades e da conciliação de políticas em áreas tão diferentes e sem relevante conexão. Volvidos vários anos, é hoje praticamente unânime, quer para o setor do desporto, quer para o setor da juventude, que não faz qualquer sentido que duas áreas com naturezas e especificidades tão distintas, ambas consagradas constitucionalmente de forma autónoma, e que devem ser vistas como absolutamente prioritárias para o desenvolvimento de qualquer sociedade evoluída, estejam sobre a tutela do mesmo organismo público.
Assim, como medida central em matéria de desporto, o COP defende a reversão do modelo vigente de estrutura orgânica e funcional do Instituto Português do Desporto e Juventude, I.P. Para além das medidas acima referenciadas, o COP considera ainda que um futuro Governo deve promover uma séria reflexão, traduzida em medidas objetivas, sobre as seguintes matérias:
1 – Regime fiscal aplicável à atividade física e desportiva em Portugal
– Tal como o COP tem vindo a propor nos últimos anos, nomeadamente em sede de discussão de Orçamento de Estado, é possível melhorar consideravelmente o enquadramento fiscal que se aplica às organizações desportivas, às suas atividades e aos seus intervenientes, contribuindo desta forma decisivamente para o desenvolvimento do desporto nacional.
Através da ligação disponibilizada aqui, é possível consultar o documento conjunto que o COP, o Comité Paralímpico de Portugal e da Confederação do Desporto de Portugal, apresentaram ao Governo em 2020 com ideias e propostas concertas neste âmbito, as quais consideramos manter a pertinência e atualidade.
2 – Estatuto de Utilidade Pública Desportiva
O regime do estatuto de utilidade pública desportiva, nomeadamente a sua atribuição, renovação, suspensão e cessação, que é regulado pela Lei de Bases da Atividade Física e do Desporto, pelo Regime Jurídico das Federações Desportivas (RJFD) e por uma Portaria (345/2012) que não foi atualizada após a última alteração ao RJFD, deve ser revisto, atendendo a alguns problemas que tem evidenciado a sua aplicação. O COP encontra-se plenamente disponível para apresentar os seus contributos concretos, de natureza mais técnica, relativamente a esta matéria.
3 – Proteção do nome, imagem e atividades desenvolvidas pelas federações desportivas
Nove anos após a entrada em vigor do regime jurídico que regula esta matéria, apesar de se ter verificado uma melhoria significativa face à realidade anterior, o COP considera que a sua redação e aplicação está longe de ser satisfatória, podendo ser claramente melhorada no sentido de acautelar os direitos das federações, nomeadamente no que respeita à organização/realização de eventos desportivos que não se encontram sobre a sua tutela direta, prevenindo os riscos de proliferação de competições, eventos e iniciativas desportivas à margem da jurisdição das respetivas federações.
4 – Tribunal Arbitral do Desporto
Consolidar o TAD no ordenamento jurídico nacional, em particular na Lei de Bases da Atividade Física e do Desporto, como a instância cimeira de jurisdição de litígios que relevam do ordenamento jurídico desportivo ou relacionados com a prática do desporto, assente na qualidade e independência dos árbitros e das suas decisões, bem como no acesso da generalidade dos agentes e organizações desportivas, de várias modalidades, a esta instância.
Sobre esta matéria o COP teve ocasião de se pronunciar, numa coletânea de textos elaborada a propósito de uma conferência que realizou por ocasião do primeiro aniversário do TAD (disponível aqui) e num parecer da sua Comissão Jurídica (disponível aqui).
5 – Integridade no Desporto
Reforçar o compromisso com uma efetiva “tolerância zero” relativamente a fenómenos como a manipulação de competições, o doping, o assédio e o abuso através de medidas obrigatórias de prevenção, sensibilização, educação e sanção a este tipo de práticas, colocando o atleta, a sua segurança, proteção e bem-estar no centro destas políticas.
Condicionar o financiamento público das organizações desportivas ao efetivo cumprimento destas medidas é um dos caminhos essenciais para se alcançar os fins pretendidos.
Impõe-se que as organizações desportivas e a administração pública desportiva implementem programas específicos, com ferramentas básicas para os agentes desportivos conhecerem estas ameaças e saberem antecipadamente como agir e se protegerem.
Neste sentido, o COP disponibiliza aos seus membros um Programa de Integridade cujos conteúdos e informação são públicos e de acesso livre na sua página oficial (disponível aqui).
A Plataforma Nacional de Combate à Manipulação de Competições Desportivas deve estar consagrada na Lei de Bases como entidade de referência na coordenação, acompanhamento e fiscalização da implementação destas medidas, nomeadamente no que respeita à manipulação de resultados, e, acima de tudo, deve ter aplicação prática.
6 – Sustentabilidade ambiental
Atendendo à responsabilidade do desporto, deve estabelecer-se uma estratégia comum e definir-se regras para que o desporto contribua para que se atinjam determinados objetivos de sustentabilidade.
A melhoria do impacto ambiental dos eventos desportivos e do funcionamento das organizações e das infraestruturas desportivas, nomeadamente no que respeita à medição, redução e compensação da emissão de carbono, tem de ser vista como uma prioridade no que respeita ao desenvolvimento desta área de atividade, e uma variável relevante para a concessão de medidas de apoio público.
7 – Mulher no Desporto
Apesar de já se encontrarem consagrados legalmente os princípios constitucionais da universalidade e da igualdade (artigos 12.º e 13.º da CRP), que também se encontram plasmados no artigo 2.º da atual Lei de Bases da Atividade Física e do Desporto, a verdade é que o princípio da igualdade de sexo não deverá ficar confinado apenas à igualdade entre homens e mulheres no acesso à prática desportiva e ao exercício da atividade desportiva, devendo caminhar-se no sentido de se prever igualmente a progressiva integração de mulheres nos órgãos estatutários das organizações desportivas, como dirigentes.
A promoção de uma renovação do Estatuto dos Dirigentes Desportivos em Regime de Voluntariado, acima mencionado, pode representar uma oportunidade para se estimular também o crescimento da participação feminina em funções dirigentes.
8 – Programa Nacional de Formação de Treinadores (PNFT)
A atividade do Treinador é de extrema responsabilidade e as suas exigências e especificidades estão em permanente evolução, o que exige uma constante atualização de competências e conhecimento. Para dar resposta a estas necessidades, criou-se há já vários anos a figura da formação contínua. No entendimento do COP, porém, esta figura carece de alguns ajustes, designadamente no que concerne à especialização, certificação e homologação dos cursos/formações e à sua relação com a modalidade “praticada” pelo formando em causa, disciplinando assim a qualidade e relevância da oferta formativa que colonizou um mercado em expansão descontrolada e, por vezes, à margem das federações desportivas.
Por outro lado, o COP entende que os conteúdos a que se faz referência no ponto relativo à Integridade no Desporto devem ser integrados na componente geral do PNFT, do nível 1 ao 4.
Numa perspetiva mais genérica, considera-se ainda relevante acrescentar que o PNFT, num país em que os treinadores são maioritariamente amadores e a sua atividade complementar à profissão que desenvolvem, é em termos de custos e tempo despendido manifestamente desadequado e pouco estimulante ao investimento na melhoria das suas qualificações e competências.
Urge refletir e concretizar mudanças que harmonizem os requisitos de formação de treinadores com a estrutura e meios do sistema desportivo nacional, fomentando a valorização da sua carreira de forma equilibrada e proporcional às condições existentes.
Conclui-se, finalmente, numa perspetiva sistémica de diagnóstico da situação desportiva nacional, onde se ancoram os motivos para as propostas ora apresentadas, pela enorme relevância na mudança de paradigma onde desporto, como já acontece em várias áreas da governação, venha a construir políticas públicas para o sector baseadas em evidências devidamente escrutinadas e regularmente avaliadas em indicadores objetivos.
Nesse propósito, o COP apresentou ao País, e ao movimento desportivo nacional em particular, dois estudos sobre a caracterização do desporto em Portugal e impacto da COVID-19 (disponível aqui) e sobre as áreas prioritárias e recomendações gerais para o setor do desporto em Portugal (em inglês – disponível aqui).
O Sumário Executivo deste último documento (em português – disponível aqui) afigura-se como um diagnóstico e uma base de trabalho muitíssimo relevantes para o debate sobre qualquer alteração ou mudança que tenha em vista as bases da politica desportiva nacional.»