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Opinião

Pedro Felner:
O desafio de Portugal na formação do tenistaExclusivo 

Foto: Federação Portuguesa de Ténis

Fundador e diretor-geral da Felner Tennis Academy, Pedro Felner é considerado um dos maiores especialistas na formação de tenistas em Portugal. Professor Adjunto Convidado da Escola Superior de Desporto de Rio Maior, o antigo selecionador nacional de sub-14 masculino escreve sobre do processo para o desenvolvimento do tenista a longo prazo e os desafios que o País precisa enfrentar para fazer a modalidade evoluir.

Por Pedro Felner*

Não existe sucesso sem um planeamento da carreira a longo prazo. É fundamental conhecer de forma profunda as diferentes fases de desenvolvimento e o trabalho a realizar em cada uma das fases de um tenista. O processo começa sempre por saber onde queremos chegar: que atleta temos e qual é o atleta queremos “construir” na trajetória.

No ténis, sabemos de temos que começar muito cedo. Mas começar cedo não é especializar cedo. Nas idades mais precoces é um grande desafio para o treinador conseguir fazer um trabalho sério e, simultaneamente, promover uma aprendizagem lúdica e divertida. Respeitar as fases de desenvolvimento e a maturação física e mental é fundamental. Temos de saber o que fazer para não correr o risco de limitar o desenvolvimento futuro ou antecipar a saída precoce da modalidade.

Diria, de forma empírica, que um dos principais factores associados ao fracasso de jovens promessas, quando chegam ao ténis júnior ou profissional, está relacionado com as limitações em termos de disponibilidade física/coordenativa. Muitas vezes estas limitações estão associadas a um processo de formação pouco diversificado, com poucos estímulos, muito focada em fazer apenas as tarefas que se traduzem mais facilmente em resultados imediatos.

Pedro Felner, treinador de ténis. Foto: DR

É importante destacar que o desenvolvimento de um tenista passa por várias fases ao longo dos anos. Eu diria que temos uma fase inicial, que vai dos 5/6 anos até aos 9 anos, em que se deve dar prioridade total à “paixão” pelo jogo e à fidelização da criança à modalidade. A competição informal adaptada à idade tem aqui um papel fundamental. As crianças gostam de “jogar” e nós temos de conseguir adaptar o jogo aos seus “skills” e à sua idade biológica.

Numa segunda fase, até aos 12 anos, importa essencialmente dotar o jovem de todas as ferramentas técnicas. Dos 12 aos 14 anos, devemos começar a “montar” o jogador em termos técnico-tácticos tendo em conta as suas características pessoais, tentando antecipar o jogador que queremos formar para o futuro. Dos 14 anos até a entrada no ténis profissional (normalmente por volta dos 18 anos), importa essencialmente potenciar as características do jogador e aqui a componente do desenvolvimento físico e mental passam a ter um papel ainda mais decisivo.

A parte física, a psicológica, a estrutura familiar e a parte financeira são exemplos de estruturas essenciais para o desportista de alto rendimento chegar ao topo. E num desporto tão global, profissionalizado e competitivo como o ténis, muitas vezes basta uma destas condições falhar para colocar em causa o sucesso do projecto.

Sei de vários exemplos de atletas que falharam os seus objectivos porque mentalmente não aguentaram o processo, porque a família não cumpriu eficazmente com o seu papel, porque fisicamente o atleta não estava dotado das competências necessárias para ter sucesso no ténis profissional, porque a base técnica o limitou no seu desenvolvimento e o deixou pelo caminho. Infelizmente, num desporto como o ténis em que o investimento financeiro na formação é muito elevado, são também muitos os que acabam por desistir por não poder suportar financeiramente os anos de investimento na sua formação.

O ponto-chave para evolução do ténis em Portugal
Portugal ainda tem um longo caminho até poder se tornar um país pertencente à elite do ténis mundial. Várias coisas ainda precisam ser melhoradas no país. No entanto, podendo escolher apenas uma, diria que aumentar a base de praticantes orientados para a prática competitiva é decisivo.

Precisamos de ter mais crianças a aprender e, principalmente, a competir. O ténis, ao contrário de outros desportos, tem uma componente importante de “participação”, orientada para a aprendizagem da modalidade e para a prática social. Qualquer jovem que se inscreva num clube para jogar futebol, tem como objectivo principal competir dentro de um quadro competitivo organizado, seja ele qual for. No ténis, não.

A grande maioria das crianças que aprende ténis nas centenas de escolas espalhadas pelo país não tem nenhum enquadramento competitivo associado às suas aulas de ténis. Vai ao clube uma a duas vezes por semana para ter aulas e fica-se por aí. Esta realidade no ténis feminino ainda é mais gritante. Não porque existam poucas meninas a jogar ténis, mas porque no caso delas a motivação intrinseca para competir é normalmente bastante diferente da dos rapazes. Diria que é fundamental arranjar estratégias para motivar para a competição os milhares de crianças que estão a aprender a jogar ténis. O prazer pela competição é o grande catalisador da motivação e da fidelização na modalidade e uma base alargada de recrutamento é fundamental para potenciar o aparecimento de futuros “campeões”.

Como formar bons treinadores de ténis
Antes de mais, um elemento essencial para a formação de bons profissionais no ténis é a “paixão” pela modalidade. Quanto ao resto eu diria que depende do tipo de treinador de que estamos a falar.

No ténis temos treinadores que trabalham essencialmente na iniciação à modalidade, outros que trabalham no ténis social com adultos, outros que se dedicam à competição para jovens, outros que se dedicam ao treino de alta competição, por exemplo. Penso que as principais qualidades de um treinador estão muito associadas ao tipo de actividade que desenvolve. Defendo que a formação de treinadores deve orientar-se por este princípio: diferentes actividades/tarefas, diferentes competências.

Uma forte base de formação geral e depois uma formação especializada nas diferentes áreas de intervenção do treinador será sempre, em minha opinião, a melhor forma de dar resposta às necessidades que temos.

Outro factor importante atualmente está ligado à tecnologia – e é preciso estar sempre atento a este segmento, que a cada dia traz novidades importantes e relevantes para formadores e atletas. Atualmente, temos muitas ferramentas associadas aos dispositivos tecnológicos que nos ajudam a melhorar o nosso trabalho. Com um simples telemóvel consigo fazer análise vídeo de jogos, consigo aceder a software de análise técnica, consigo aceder a estatísticas etc. O uso da tecnologia já faz parte da rotina de trabalho de qualquer treinador e é preciso se adaptar às novidades e, melhor, usufruí-las.

*PEDRO FELNER, 45 anos, natural de Maputo, em Moçambique, licenciou-se em Educação Física e Desporto pela Universidade Lusófona de Humanidades e Tecnologias (ULHT) e possui o título de Especialista em Desporto (Ténis) pela Escola Superior de Desporto de Rio Maior (ESDRM). Foi o “Treinador do Ano” pela Associação Portuguesa de Treinadores de Ténis (2007) e nomeado para o prémio “Treinador do Ano” pela Confederação do Desporto de Portugal (CDP) em 2010, 2011 e 2013 (finalista). Tem no currículo ainda passagem pela Seleção Nacional sub-14 e a conquista, como treinador da equipa, do vice-campeonato da  Europa e do Mundial, em 2009.

** Este artigo é parte do dossier sobre a “preparação do atleta a longo prazo”, abordagem realizada pela SM, na edição n.º 1 da nossa revista.  O material completo está disponível para os assinantes. Se ainda não é, saiba como fazer para integrar o nosso grupo de leitores e colaborar com o nosso projeto.

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