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O coordenador técnico na entidade formadora: da responsabilidade à operacionalização e supervisão de tarefasExclusivo 

Eduardo Teixeira é professor na Escola Superior de Desporto de Rio Maior – ESDRM. Foto: D.R.

Por Eduardo TeixeiraEscola Superior de Desporto de Rio Maior / Instituto Politécnico de Santarém Centro de Investigação em Qualidade de Vida (CIEQV)

Enquadramento
O desenvolvimento integral de um modelo de Direção/Coordenação Técnica dota os clubes de bases organizativas capazes de projetar, preparar e adaptar a instituição para as exigências que lhes são colocadas a curto, médio e longo prazo, proporcionando-lhe, consequentemente, viabilidade, vitalidade, legalidade e reconhecimento social. Alguns autores, como por exemplo Weinberg e Gould (2003) e Wein (2004), afirmam que os paradigmas organizacionais dos clubes devem adaptar-se às necessidades formativas dos jovens jogadores garantindo-lhes um processo de qualidade metodológica e pedagógica.

O processo de organização e intervenção das entidades formadoras deve interligar as competências técnicas da modalidade com as da gestão do desporto (Stafford, 2015; Teixeira, 2013). Nesta premissa, a função do coordenador técnico torna-se determinante para a sistematização de um processo que visa ordenar e gerir múltiplas atividades e tarefas técnicas de uma organização.

Consideramos que a responsabilidade coordenativa
deve estar balizada em quatro dimensões, nomeadamente na conceptualização e preparação da coordenação técnica (preocupações, estratégias e procedimentos a implementar no desempenho da função), na organização da entidade formadora (proposta organizacional da entidade e planeamento da dinâmica de funcionamento das áreas funcionais, escalões de formação e recursos), na conceção e implementação de um modelo de formação (adoção de uma filosofia formativa, nomeadamente nas ideias para o treino e jogo em função das várias etapas formativas) e, ainda, na operacionalização e/ou supervisão propriamente dita das tarefas coordenativas.

Fundamentados no trabalho de Teixeira (2021), destaca-se algumas orientações relativas à quarta dimensão deste modelo coordenativo, que compreende as tarefas específicas que estão inerentes à função do coordenador técnico.

A responsabilidade coordenativa
O coordenador técnico lidera, orienta, facilita e operacionaliza, na forma e no conteúdo, cada detalhe do trabalho técnico global de uma entidade formadora. Uniformizado por diretrizes e princípios, deve estimular o desempenho e a produtividade de todos os envolvidos no complexo processo de funcionamento da entidade, através das várias áreas funcionais e escalões de formação, facilitando o alcance da missão, vocação e objetivos definidos pelo clube. Características como a vivência desportiva, formação técnica e/ou académica e, ainda, um perfil pessoal que releve carácter, capacidade relacional, compromisso e liderança, são importantes para o desempenho da função.

Importa salientar que o tipo de intervenção do coordenador
técnico é muito influenciado pelo contexto organizacional da entidade formadora, ou seja, se a função agrega a lógica de direção e coordenação, os âmbitos de intervenção apresentados no quadro 1 têm todos dependência direta da fígura que assume este cargo. Se isso não ocorrer, quando por exemplo o papel do coordenador técnico é dirigido exclusivamente para a intervenção mais técnica, algumas destas tarefas podem ser segmentadas e distribuídas por outros responsáveis, tais como diretores gerais, subcoordenadores técnicos, secretários técnicos, entre outros, passando o coordenador técnico a ter um papel de supervisão em algumas dessas áreas específicas de intervenção.

O desempenho da função de coordenador técnico na entidade formadora tem, ainda, de obedecer a normas de conduta, especialmente na defesa intransigente dos interesses do clube, no respeito pelas diretrizes emanadas pelas estruturas hierárquicas superiores, pelo apoio e respeito constante aos elementos que compõem toda a estrutura do clube (jogadores, treinadores, técnicos especializados, elementos de apoio, entre outros), pelo desenvolvimento de um trabalho contínuo e metódico e, ainda, pela manutenção de uma atitude permanente de rigor, partilha, entreajuda e dedicação.

As tarefas operacionais do coordenador técnico
O trabalho do coordenador técnico desenvolve-se no sentido de envolver o coletivo através de uma ideia/visão de futuro (através de uma comunicação assertiva e eficaz com todos os protagonistas institucionais), na capacidade de hierarquização das prioridades formativas e na definição clara de objetivos de intervenção. Seguidamente, expomos as tarefas de base que nos parecem decisivas na intervenção de um coordenador técnico para, posteriormente, desenvolvermos um pouco o conceito de cada uma delas.

Síntese das principais tarefas operacionais e/ou de supervisão do coordenador técnico:
• Definir a regulamentação geral e específica da EF;
• Dinamizar a forma e as vias de comunicação interna e externa da EF;
• Selecionar e parametrizar o sistema de gestão de informação da EF;
• Planear toda a atividade desportiva específica da EF;
• Projetar atividades complementares na EF;
• Supervisionar e controlar com regularidade todas as atividades da EF;
• Prescrever as orientações para o planeamento técnico das equipas da EF

Regulamentação da entidade formadora
Elaboração de um organograma ou fluxograma que permita fixar os órgãos, sistematizar o seu regime de funcionamento e comprometer os seus intervenientes a seguir e respeitar os procedimentos institucionais que, por um lado, fortificam a identidade coletiva da entidade e, por outro, objetivam tomadas de decisão de âmbito disciplinar perante eventuais incumprimentos das normas instituídas. O manual de boas práticas, elaborado de raiz ou ajustado pelo coordenador técnico pode compreender, pelo menos, os seguintes capítulos: i. introdução; ii. vocação, missão e objetivos; iii. dinâmica organizacional da entidade formadora; iv. normas e condutas; v. regulamento disciplinar; vi. planos de intervenção (como, por exemplo, planos formativos, planos de segurança, planos de alimentação e planos de higiene); vii. disposições gerais ou finais do regulamento.

Comunicação organizacional (interna e externa)
No sentido de fomentar a qualidade da comunicação e informação no processo de liderança recomenda-se que o coordenador técnico promova e operacionalize os seguintes procedimentos:
• Agendar reuniões institucionais (definir o tipo de reuniões a promover, os elementos envolvidos e a periodicidade das mesmas);
• Definir o contacto oficial da coordenação técnica;
• Supervisionar a página web e redes sociais da entidade formadora;
• Promover a criação e divulgação de boletins informativos/newsletters;
• Garantir a gestão da informação através de uma plataforma digital integrada (nesta dinâmica devem ser consideradas as informações individuais dos elementos da entidade formadora; as informações dos recursos disponíveis; as informações de âmbito desportivo e competitivo; as informações de scouting; e as informações de gestão administrativa).

Planeamento geral das atividades
Com o objetivo de planear-se toda a relação estruturas interna da entidade, a definição e constituição das várias equipas de trabalho, a organização dos recursos espaciais, temporais, materiais e logísticos e, ainda, a programação e calendarização da atividade desportiva, sugere-se a produção e desenvolvimento dos seguintes planos:
• Plano de organização geral da entidade (definição dos treinadores, staff de apoio, organização dos treinos e competições e as datas dos vários períodos da época);
• Planos de informação específico das equipas (identificação individual dos elementos que integram cada uma das equipas);
• Agenda da atividade competitiva (planeamento anual das competições de cada uma das equipas);
• Plano semanal de organização competitiva (documento detalhado de toda a dinâmica organizativa de cada uma das equipas para o ciclo competitivo semanal);
• Plano de gestão da alimentação em dia de competição;
• Plano de formação e supervisão das equipas técnicas.

Planeamento e Organização de atividades complementares
Promover, planear e gerir ações diversas tais como a organização de torneios, implementação de formação contínua, festas de comunidade, atividades para encarregados de educação, visitas desportivas, treinos de captações, férias desportivas e outras que possam contribuir para a promoção, desenvolvimento e aplicação de boas práticas técnico-pedagógicas.

Supervisão e controlo das atividades
A relação do trabalho técnico mais conceptual e burocrático do coordenador técnico deve ser combinado com o acompanhamento no terreno das várias áreas funcionais da entidade e, principalmente, da atividade desportiva propriamente dita (treinos e jogos das várias equipas). Assim, regulamente, e de forma mais ou menos informal, há a necessidade de interagir, observar, analisar, registar e avaliar o processo operacional das áreas funcionais, para consubstanciar pressupostos planeados e definidos no modelo formativo.

Princípios orientadores técnicos de planeamento das equipas
O coordenador técnico, em função de cada uma das etapas formativas definidas no modelo, propõe princípios orientadores capazes de promover dinâmicas de trabalho similares e transversais às várias equipas da entidade formadora, nomeadamente:

• Princípios para o planeamento anual: definição de diretrizes para a caracterização dos grupos de trabalho, na organização logística de treino e competição, na caracterização das competições, na definição dos objetivos, na adaptação do modelo de jogo e modelo de treino e na periodização da época desportiva;
• Princípios para o planeamento semanal: orientações para a execução dos programas de preparação dos ciclos de treino, das sessões de treino (estruturado e complementar), da preparação logística dos jogos, da elaboração dos planos estratégicos para jogo e, ainda, para a organização das rotinas do dia de jogo;
• Princípios de contextualização da calendarização: conhecimento e análise da calendarização das diferentes competições e iniciativas a participar pelas diversas equipas para, posteriormente, periodizar-se e proceder-se ao planeamento dos conteúdos a abordar em função do Modelo Formativo da Entidade Formadora e da respetiva Etapa de Formação em que cada equipa se encontra, valorizando, sempre que possível, o jogador e a sua individualidade, promovida e desenvolvida num contexto coletivo

Considerações finais
A intervenção do coordenador técnico deve balizar-se pelo respeito da missão, vocação e objetivos da entidade formadora. Quanto mais coerente e eficaz é o desenvolvimento do seu trabalho maior é a probabilidade de se criar uma identidade coletiva que traga reais benefícios para a qualidade formativa prestada aos jogadores. As tarefas descritas no presente artigo são alguns dos exemplos práticos que podem contribuir para esse fim.

Simultaneamente, e não esquecendo todas as restantes dimensões de intervenção, a operacionalização destas tarefas poderão, também, oferecer um contributo interessante no cumprimento dos critérios exigidos pela Federação Portuguesa de Futebol para o Processo de Certificação das Entidades Formadoras (2018).

Referências
• Federação Portuguesa de Futebol (2018). Manual de Certificação das Entidades Formadoras da Federação Portuguesa de Futebol.
• Stafford, I. (2005). Coaching for long-term athlete development: to improve participation and performance in sport. Leeds: Sports Coach UK.
• Teixeira, E. (2013). Futebol: Coordenação técnica de um departamento de futebol de formação. Trabalho enquadrado no âmbito da defesa do Título de Especialista na área de Desporto, modalidade desportiva de futebol (não publicado).
• Teixeira, E. (2021). Coordenação técnica no futebol de formação. Do pensamento à ação. Edição Visão Contextos. ISBN 978-989-54777-4-6.
• Wein, H. Fútbol. (2004). A la medida del niño (vol. 1 e 2). Centro de estúdios, desarrollo e investigation del fútbol.
• Weinberg, R. & Gould, D. (2003). Foudations of sport and exercise psychology. Human Kineticks. USA.

Foto: Escola Superior de Desporto de Rio Maior – ESDRM

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