Inês Caetano*
Sports Embassy
O desafio foi lançado: trazer “para cima da mesa” a visão dos Atletas sobre a carreira dual e o pós-carreira, de forma a ajudar os treinadores a ter cada vez mais o papel de facilitador deste contexto na carreira dos seus desportistas. Desafio aceite.
A Sports Embassy nasceu há quatro anos, celebrados precisamente no decorrer do 13th ICCE Global Coach Conference, onde esta revista estará também a ser lançada. Não haveria melhor lugar nem melhores pessoas com quem celebrar esta data que, diria eu, já é histórica por vários motivos. Em primeiro lugar, porque quando demos o pontapé de saída para este projecto, pouco se falava do pós-carreira ou das carreiras duais e hoje temos jornalistas generalistas e desportivos – em Portugal – a perguntar a Atletas de topo o que pensam fazer depois de terminada a carreira no Desporto. Depois, temos a comunicação social a evidenciar Atletas que têm uma carreira desportiva de sucesso e mantêm uma vida profissional (ou de estudantes) em consonância com o Desporto. São pequenos passos que vão sendo dados e que podem – e devem – ser replicados um pouco por todos nós.
Nascemos com o objectivo de funcionar como facilitadores na preparação de Atletas para a vida após o Desporto, tendo desenvolvido um programa com esse fim (Your Future) entre outras iniciativas que visam enaltecer as competências que se adquirem no Desporto e a sua transferência para outras áreas profissionais, sociais, interpessoais, etc. Montra de Talento, HeadsUp, Academia Sports Embassy ou Legacy Magazine são alguns desses projectos.

A Sports Embassy se dedica à gestão da interação de ex-atletas com o universo empresarial. Foto: Sports Embassy
Acredito que todos temos o nosso papel para fazer perpetuar as valências do Desporto nas nossas vidas, mas, mais importante ainda, garantir que elas são transmitidas para quem não andou pelos campos, pavilhões, relvados, pistas, piscinas, tatamis, ringues, picadeiros, e por aí fora. No limite, conseguir que um médico, arquitecto, professor, contabilista, economista, empresário, lojista, cientista ou motorista seja um melhor profissional porque foi Atleta, é estarmos a contribuir para a ideia de que praticar Desporto é muito mais do que apenas praticar actividade física “porque faz bem à saúde”.
A verdade é que muitos Atletas desistem da prática desportiva federada quando chega à altura de ir para a Faculdade. Não preciso de apresentar números porque todos os treinadores sentem isso “na pele” e os que treinam outros escalões vêm isso acontecer ao seu lado. Deixo a seguinte questão: qual é o papel dos treinadores na retenção destes jovens Atletas e a partir de quando essa retenção deve ser preparada?
Dizermos que “no Desporto se formam Homens” parece-me curto se depois não formos capazes de facilitar a vida dos Atletas para que possam conciliar uma vida pessoal, familiar, social e profissional com o Desporto que, por sinal, vai terminar cedo correndo o risco que isso ocorra abruptamente. Falar do pós-carreira é (também) falar na prevenção da saúde mental.
Para os treinadores que passaram por isso (e serão vários) é fácil perceber que é uma altura complexa do ponto de vista da gestão emocional para o Atleta que terá, obviamente, impacto na sua performance; para alguns começa a sê-lo bastante cedo porque não vêm uma solução, não têm uma rede de apoio, acham que não podem falar sobre isso porque são considerados como “acabados” para a modalidade (infelizmente acontece), não sabem o que fazer depois de terminada a carreira, não se preparam financeiramente, o contexto familiar também não tem as ferramentas para ajudar, entre tantos outros factores. Não será importante minimizar o impacto destas dúvidas e incertezas e garantir a estabilidade que o Atleta precisa para manter os níveis da sua performance?
A vida depois do Desporto começa no primeiro dia em que as crianças chegam ao treino para experimentar. Depois vão ficando, algumas delas. Tornam-se Atletas federados e, muito poucos comparativamente com aqueles que começaram, chegam a Séniores. Menos ainda conseguem viver da modalidade e da carreira desportiva. Mas todos eles têm, forçosamente, que ter uma carreira além do Desporto.
E deixá-los melhor preparados para isso faz também parte do papel do treinador que é também, muitas vezes, de pai/mãe, psicólogo, fisioterapeuta, condutor, entre tantas outras funções independentemente do escalão que treina. Mas que este papel de “mentor”, “orientador” ou “consultor” não seja visto como mais um encargo, mas sim como o privilégio de saber que um dia aquele Atleta – e não importa o que alcançou no Desporto – pode vir a ser o melhor do mundo numa outra área qualquer e sim, teve na sua formação desportiva as bases para o alcançar.
Iremos falar sobre isto neste espaço que, com muita honra e com um grande sentido de responsabilidade, me foi atribuído e que muito agradeço, em nome da valorização dos Atletas enquanto pessoas e enquanto futuros profissionais em outras áreas que os faça felizes.
*INÊS ALVES CAETANO, ex-atleta de pentatlo moderno, esteve muitos anos ligada à formação e treino personalizado e gestão desportiva. É fundadora da Sports Embassy, que se dedica à gestão da interação de ex-atletas com o universo empresarial.