João Campos, o consagrado treinador que levou Fernanda Ribeiro ao pódio olímpico, divide hoje o seu tempo entre a formação de jovens atletas e as aulas na Universidade da Maia. Severo com um certo aburguesamento da sociedade, que se reflete na falta de figuras de proa no meio-fundo e fundo equivalentes aos anos dourados, inconformado mas ainda fiel a uma filosofia de treino sustentada no trabalho.
SportMagazine (SM) – Nos últimos anos houve um certo “apagão” no fundo e no meio fundo em Portugal? Vê razões objetivas?
João Campos (JC) – Uma delas é a paixão. Ou a falta dela. Falta paixão nas novas gerações, e estou a falar de treinadores e de atletas. O mundo mudou muito. Antes, os atletas vinham para o atletismo porque gostavam da modalidade e queriam ‘viajar de avião’. Os pais traziam os filhos para o atletismo. Hoje já toda a gente viaja de avião desde pequenino e houve um certo aburguesamento. O atletismo é um desporto duro, com menor capacidade de atração e também não há um calendário de provas juvenis que favoreça essa captação de miúdos que ainda estão em idade escolar. Fundamentalmente falta paixão e também falta dinheiro. Eu sou treinador ‘pro bono’ e os atletas também só começam a ganhar algum dinheiro quando chegam ao estatuto olímpico. Até lá vão desistindo pelo caminho. Mesmo os patrocínios das marcas são muito difíceis. Com a pandemia, a Adidas fechou 85 lojas. Estamos num mundo muito diferente daqueles anos da Fernanda Ribeiro.
SM – O meio externo, tudo o que rodeia a nossa vida, é hoje mais agressivo. Há mais pressão social, a opinião, boa ou má, circula rápido. Vê nisso um handicap importante para a evolução desportiva ou é o mundo que temos e por isso temos que nos adaptar?
JC – Isso é certo. Os atletas não têm uma realidade alternativa. Claro que há mudanças. Antes não era preciso telefonar a ninguém para vir treinar. Os atletas compareciam a horas. Hoje nem sempre é assim. Há mais distrações. Muitos nem estudam, nem treinam, e isto fazendo as duas coisas. Na realidade não aproveitam utilmente nenhuma delas. Nós nascemos com qualidades inatas para certo rendimento, mas temos que as desenvolver. Eu já disse e repito que o talento é fundamental mas precisa de trabalho. O trabalho é muito mais importante. O talento explora-se e desenvolve-se através do trabalho.
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